O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por dificuldades na comunicação social, interação social, padrões restritos e repetitivos de comportamento. Embora tradicionalmente diagnosticado na infância, há um número crescente de adultos que vivem sem diagnóstico, enfrentando desafios significativos em suas relações afetivas, familiares, no trabalho e comprometendo sua saúde mental. (NCBI)
A resistência ao diagnóstico em adultos pode ser motivada por medo, negação, estigma social e desconhecimento. Este artigo explora os fatores que levam à recusa em buscar ajuda, os impactos dessa recusa e estratégias para sensibilização e apoio.
Resistência, Negação e Medo: Barreiras ao Diagnóstico
Principais fatores de resistência:
- Estigma social e preconceito: Muitos adultos associam o autismo a uma condição infantil, deficiente ou incapacitante, o que gera vergonha ou medo de rotulação.
- Camuflagem social: Indivíduos com TEA nível 1 frequentemente desenvolvem estratégias para “mascarar” seus traços autistas aso logo da vida, dificultando a percepção do próprio funcionamento atípico, afastando-se de sua real identidade, levando a consequências de quadros concomitantes como o TOC, Ansiedade e Depressão. (mulpress.mcmaster.ca)
- Transtornos Sensoriais: também podem aumentar gatilhos de crises de raiva, pouca resistência frustração, aparecimento de enxaquecas, alergias, problemas gastrointestinais, alteração no sono, rebaixamento da libido, desinteresse sexual, crises de shutdowns, meltdowns, mais sensibilidade a sons, luz, ao toque, alimentação muito seletiva/restritiva, mesmice, isolamento social e dificuldades na comunicação.
- Comorbidades presentes e concomitantes ao TEA: Ansiedade Generalizada, Ansiedade Social, Depressão, TDAH, Transtorno Obsessivo Compulsivo – TOC e Acumulação, são comuns em adultos autistas e muitas vezes tratadas isoladamente, ou negadas, ignoradas pela pessoa ou ainda sem nenhuma investigação médica ou tratamento em conjunto com a possibilidade também estar no espectro autista. Estas comorbidades levam a instabilidade emocional, rebaixamento da libido ou compulsões sexuais adversas, isolamento social, desinteresse por hobbies, desinteresse por lazer ou diversão compartilhado, comportamentos de trabalhar tipo wokhollic, hiperfocos persistentes, inflexibilidade cognitiva, irritabilidade, dificuldades na comunicação e isolamento social. (PubMed)
- Psicopatologias: Presença de depressão, ansiedade, transtorno de personalidade borderline, TOC ou TDAH pode tornar o autismo menos evidente ou menos considerado como causa primária.
- Medo da crise de identidade: Aceitar que se é diferente (num espectro neurodiverso) pode gerar crise identitária, sofrimento emocional, luto pela pessoa que se pensava ser. Para muitos, negar é um mecanismo de autoproteção psicológico, para evitar enfrentar desafios já acumulados e angústias presentes ao longo dos anos.
- Histórico de invalidação: Muitos adultos relatam terem sido ignorados ou desacreditados ao expressar suas dificuldades aos pais e parceiros, falta de acesso a ajuda especializada na infância/adolescência ou vida adulta, falta de informação especializada em autismo em adultos, o que reforça a negação, o estigma e resistência em procurar ajuda. Muitos acreditam que nada mais poderá ser feito com o diagnóstico tardio.
- Estratégias de coping: (evitamento, negação, distração) que agravam sintomas emocionais secundários. Por exemplo, uso excessivo de esquemas de evitação ou negação de estresse correlacionam-se com a piora da saúde mental em adultos autistas. (PubMed)
Recursos limitados e barreiras estruturais
- Dificuldade de acesso a profissionais qualificados para adultos (psicólogos, psiquiatras, neuropsicólogos familiarizados com TEA em adultos).
- Custo financeiro, espera, burocracia.
- Falta de políticas de saúde que incluam adultos autistas de forma abrangente. No Brasil, por exemplo, há iniciativas recentes para ampliar cuidado integral às pessoas autistas adultas e idosas. (Portal da Câmara dos Deputados)
Consequências da Falta de Diagnóstico
Relações Sociais e Familiares
- Dificuldade em interpretar sinais sociais, manter conversas naturais e lidar com ambientes sensoriais intensos.
- Isolamento social, instabilidade do humor, inflexibilidade cognitiva, baixa autoestima e sensação de inadequação persistente.
- Repertórios socioemocionais mais deficitários.
Casamento e Parentalidade
- Problemas de comunicação e empatia dupla (Milton, 2012) dificultam a convivência conjugal.
- Pais autistas não diagnosticados podem ter dificuldades em compreender as necessidades emocionais dos filhos.
- Adultos com TEA podem ter filhos neurodivergentes e não reconhecer os sinais, perpetuando o ciclo de negação e comprometimento a saúde emocional de todos.
Ambiente de Trabalho
- Dificuldades com mudanças de rotina, comunicação ambígua e sobrecarga sensorial podem comprometer o desempenho profissional. Muitas vezes, levando ao burnout autista.
- Sem diagnóstico, não há acesso a adaptações legais, garantias de direitos e como reconhecimento de PCD.
Consequências da negação / ausência de diagnóstico
As implicações para diferentes domínios da vida adulta são diversas:
Domínio | Possíveis consequências da negação/diagnóstico tardio |
Relações interpessoais sociais | isolamento, falhas na comunicação, dificuldades de empatia, relacionamentos superficiais, sentimentos de alienação ou ser “mal-entendido”; maior risco de bullying, rejeição social. |
Trabalho desempenho profissional | dificuldade em ambientes que exigem comunicação social ou flexibilidade; burnout por esforço de mascarar; menor progresso na carreira; demissões ou incapacidade de manter emprego estável. |
Casamento parceria afetiva | conflitos decorrentes de expectativas divergentes; cônjuge não compreende desafios de leitura social; frustração de ambos os lados; má comunicação, brigas, insatisfação, desgaste emocional, levam a possível ruptura do relacionamento. |
Parentalidade | para pais autistas, desafios em interpretar pistas emocionais dos filhos, lidar com demandas múltiplas, sobrecarga emocional; possível transmissão de falta de diagnóstico para filhos; risco de não reconhecer TEA em filhos ou negar apoio necessário. |
Saúde mental | depressão, ansiedade, baixa autoestima; sensação de inadequação; risco de suicídio maior em autistas com diagnóstico tardio ou falta de suporte; exaustão mental (burnout autista). |
Qualidade de vida geral | dificuldade no autocuidado, regulação emocional, lidar com sensações sensoriais desconfortáveis, rotina; menor satisfação de vida; falta de estratégias adaptativas eficazes. |
Essas consequências são confirmadas em diversos estudos internacionais que apontam que adultos que só obtêm diagnóstico depois de muitos anos relatam alívio emocional, melhor autocompreensão, mas também prejuízos acumulados (social, econômico, de autoimagem). (PubMed)
Pais que negam buscar ajuda para filhos com suspeita de autismo
Quando se trata de menores, a negação ou resistência dos pais/ responsáveis é um problema também relevante:
- Fatores: medo de estigma, negação de que em algum momento isso vai passar, “não gosto de psicólogos ou médicos psiquiatras, isso é coisa de louco”, “eu também era assim na infância e na adolescência e fiquei bem”, “ele é muito inteligente é só uma fase”, crença de que apenas é um “problema de temperamento” ou “manias de criança” são normais, falta de informação, dificuldade de acessar serviços especializados.
- Consequências: atraso em intervenções eficazes nos primeiros anos de vida levam a melhor prognóstico; quanto mais tarde o diagnóstico de intervenções de equipe multidisciplinar maiores prejuízos nas habilidades sociais, de linguagem, autorregulação; estresse familiar mais intenso; possibilidade de surgimento ou agravamento de comorbidades (ansiedade, depressão).
- Informação baseada em evidências: Apresentar dados sobre os benefícios do diagnóstico precoce e intervenções eficazes. Não aceitar promessas mágicas e cura do autismo, isso não existe. Procurar sites, artigos científicos, clínicas e profissionais qualificados e com experiencias consolidadas. (Sociedade Brasileira de Pediatria)
- Acolhimento emocional: Validar o luto e medo dos pais, sem julgamento.
- Envolver a escola e profissionais: Educadores e terapeutas podem ser aliados na sensibilização dos pais, família e irmãos.
Orientações aos Pais:
- Sensibilização dos pais por meio de material educativo, contato com outras famílias, testemunhos.
- Aconselhamento psicológico para os pais para auxiliá-los a aceitar a hipótese diagnóstica e lidar com culpa, fantasias, vergonha, medo e estigmas.
- Facilitar acesso a diagnóstico precoce, com profissionais que trabalhem em parceria com famílias.
- Políticas de saúde e educação para obrigatoriedade de triagem em saúde infantil, capacitação de médicos de atenção primária para detectar sinais precoces.
Estratégias de Sensibilização e Manejos
Para o Adulto em Negação
- Educação neurodivergente: Compartilhar conteúdos acessíveis sobre autismo adulto, como blogs, vídeos e relatos pessoais.
- Validação emocional: Evitar confrontos, culpa e oferecer escuta empática. A negação muitas vezes é uma defesa contra o medo da exclusão e ao estigma social.
- Grupos de apoio: Participar de espaços seguros com outros adultos autistas pode facilitar o reconhecimento e aceitação.
- Importância da avaliação especializada: Avaliação Neuropsicológica e avaliação clínica com psiquiatra especialistas em autismo em adultos. A Psicóloga Marina Almeida, especialista em pessoas neurodiversas, oferece avaliação neuropsicológica on-line para autismo (TEA) e TDAH em adultos, psicoterapia on-line para pessoas autistas e TDAH, psicoterapia on-line para parceiros de pessoas autistas para cuidado da saúde emocional e ou orientações de sensibilização. Entre em contato comigo por mensagem no WhatsApp +55 (13) 991773793.
Para os Cônjuges
- Comunicação direta e previsível: Evitar linguagem ambígua e criar rotinas claras, conversas pontuais entre o parceiro e levantar os pontos positivos da relação, negativos e o que precisam mudar juntos, numa perspectiva do que é bom para nós como casal, ou como uma família.
- Respeito à sensorialidade: Adaptar o ambiente doméstico às necessidades sensoriais do parceiro.
- Empatia e paciência: Reconhecer que o parceiro autista não é frio ou indiferente, mas possui uma forma diferente de expressar afeto ou que não desenvolveu formas de expressar sua empatia e não possui repertório socioemocional.
É necessário mais pesquisa especialmente no contexto brasileiro sobre adultos com TEA tardiamente diagnosticados: quantificar perdas concretas, avaliar eficácia de intervenções específicas. As diferenças culturais no estigma, nas expectativas familiares, nas normas sociais influenciam bastante a forma como a negação ou resistência se manifestam.
A importância de modelos integrados de suporte que combinam avaliação, intervenção psicossocial, suporte familiar e mudanças de políticas.
A resistência ao diagnóstico de autismo na vida adulta é multifatorial e profundamente enraizada em questões emocionais, sociais e culturais. O desconhecimento sobre o espectro em adultos e o estigma associado dificultam o acesso ao suporte adequado.
No entanto, com estratégias de sensibilização, educação e acolhimento, é possível promover o reconhecimento, a aceitação e a busca por ajuda qualificada.
As consequências de uma pessoa com hipótese de autismo não procurar ajuda pode levar ao desgaste do parceiro no namoro, casamento, comprometer a parentalidade, relação com os filhos e adoecimento psíquico do grupo familiar. A relação pode ser tornar tóxica, abusiva, conflituosa, pouco gratificante emocionalmente e sexualmente, gerar codependência afetiva e submissão sádica-masoquista.
O diagnóstico não é um rótulo, mas uma chave para o autoconhecimento, para buscar ajuda especializada, desenvolver relações mais saudáveis e para uma vida com mais autonomia e bem-estar biopsicossocial.
Fontes:
Associations between coping strategies and mental health outcomes in autistic adults. (PubMed)
Autism Spectrum Disorder in Adults: Diagnosis and Management (NICE) guideline. (NCBI)
Autism Spectrum Disorder: Difficulty in Adult Diagnosis. (mulpress.mcmaster.ca)
Autismo: entenda os impactos do diagnóstico tardio em adultos — especialista brasileiro Leandro Cunha. (Estado de Minas)
Experiences of Support Following Autism Diagnosis in Adulthood. (PubMed)
Psychoeducational group intervention for intellectually able adults with autism and their close relations (Prisma). (BioMed Central)
Agência Brasil – Impactos do diagnóstico tardio
Autista em Casa – Guia de relacionamentos
CNN Brasil – Autismo na vida adulta
Grupo Conduzir – Pais em negação
Mágicas de Mãe – Negação dos pais
Portal do TEA – Amor no espectro
Revista Brasileira de Neuropsiquiatria – Diagnóstico em adultos
Revista FT – Autismo e comorbidades
Sociedade Brasileira de Pediatria – https://www.sbp.com.br/
UOL – Sinais de autismo em adultos
WikiHow – Apoiar um cônjuge autista
Marina da Silveira Rodrigues Almeida – CRP 06/41029
Psicóloga Clínica, Escolar e Neuropsicóloga, Especialista em pessoas adultas Autistas (TEA), TDAH, Neurotípicos e Neurodiversos.
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